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4 jul 2012

Mitologia e Guerra nas Estrelas: a Jornada do Herói

Ela começa como uma simples narrativa da luta do bem contra o mal, mas acaba se convertendo num dos maiores fenômenos culturais de todos os tempos. Composta por seis capítulos que a formam em um autêntico épico universal, Guerra nas Estrelas se transformou numa saga que narra um dos temas mais relevantes presentes em toda literatura, mitologia e tradições religiosas mundiais.

Muito semelhante à uma escritura sagrada dos dias atuais, a obra cinematográfica de George Lucas atualizou os antigos arquétipos presentes nas obras simbólicas das mais importantes tradições antigas e apresentou velhos mitos repaginados para as novas gerações. Não há dúvida que o filme rompeu os limites da comunicação da mensagem universal presente nos grandes clássicos da antiguidade.

Ainda na década de 1970, Guerra nas Estrelas inaugura o fenômeno da criação do mito moderno, exibido nas grandes telas do cinema e carregado de sons, imagens e efeitos especiais.

Naquela época, a sociedade passava por difíceis e profundas transformações sociais e políticas, e o indivíduo experimentava uma crise de identidade, uma vez que os antigos valores haviam sido virados de cabeça para baixo.

O ciclo de Guerra nas Estrelas reapresenta de maneira impactante o cerne mitológico que compreende a existência do bem e do mal, bem como a missão de um herói que é levado à enfrentar este mal e vencê-lo.

Os mitos sempre foram ferramentas de grande importância para que o ser humano pudesse compreender o funcionamento do universo, e não apenas o grande universo que se manifesta em seu exterior, mas também do seu próprio universo interior.

Por isso, um de seus temas centrais é a jornada do herói, presente em todos os seis filmes de Guerra nas Estrelas. A conexão entre a saga da família Skywalker e a mitologia começa com o famoso historiador e mitólogo Joseph Campbell, o autor do livro O Herói de Mil Faces, que foi usado por George Lucas na construção de sua obra.

Veja a Série Completa:

Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 1
Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 2
Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 3
Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 4
Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 5
Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 6
Mitologia e Guerra nas Estrelas: Parte 7

De acordo com Campbell, o mito é uma metáfora para a experiência da vida. Ele teve seu trabalho influenciado por Carl Gustav Jung, o psicólogo suíço que deu origem à Psicologia Analítica e às teorias dos arquétipos do inconsciente. George Lucas estudou a obra de Campbell e acabou usando em seus filmes a temática da Jornada do Herói, uma das formas mitológicas apresentadas em O Herói de Mil Faces.

Esta jornada é o fundamento da maioria dos grandes mitos presentes em todas as civilizações, e consiste numa caminhada iniciática que leva o personagem principal à uma transformação onde uma identidade adolescente que antecede a vida sexual é trocada por outra, a identidade adulta já familiarizada com a sexualidade e os demais desafios apresentados pela existência humana.

Ao longo de Guerra nas Estrelas, a Jornada do Herói é percorrida por dois personagens, Anakin Skywalker e seu filho Luke Skywalker. Os dois recebem um chamado para a aventura, e nenhum deles espera ser um herói. Os dois são atraídas para a luta entre o bem e o mal, e então precisam decidir de qual lado irão ficar. A jornada de Anakin acaba se tornando uma tragédia, quando ele é levado pelo medo e pela ambição à se juntar ao lado negro da Força, enquanto a jornada de Luke se converte em uma busca pela redenção de seu pai.

No início, Luke é uma pessoa comum, que vive uma vida tranquila e aborrecedora. Ele é inocente e inseguro, assim como os heróis de outras mitologias, antigos como o rei Arthur ou mais modernos, como Dorothy Gale, de o Mágico de Oz, ou mesmo o pequeno mago Harry Potter. Estes personagens provocam a simpatia dos espectadores, pois compartilham das mesmas inseguranças e dos mesmos medos de todo ser humano.

Mas logo o herói é convocado para uma aventura quando um dos robôs comprados por seu tio reproduz a mensagem de uma princesa pedindo socorro. Esta convocação tira Luke do conforto e de perto daquilo que lhe é familiar. Ao procurar Obi-Wan Kenobi ele se dirige para o desconhecido e o desafiador, e o conhecimento de vida que possuía até então já não será mais suficiente.

Logo o velho Ben o convida para seguir viagem com ele até Alderaan, e assim ingressar definitivamente na luta do bem contra o mal. Luke hesita, da mesma forma como o grego Ulisses ou o hebreu Moisés não desejavam encarar aquilo que parecia ser muito maior do que eles próprios. Mas a vida o arrasta para a jornada, e quando seus tios são assassinados perlas forças imperiais, ele decide seguir em frente.

Para chegar à Alderaan, é preciso encontrar transporte em Mos Eisley, que Obi-Wan descreve como sendo “uma colmeia miserável de escória e vilania.” Na cantina de Mos Eisley, um lugar bizarro e perigoso, Luke enfrenta a etapa da Travessia do Umbral, o momento em que todo herói, à maneira da pequena Dorothy, sente que não está mais no Kansas.

Depois de realizar esta travessia, Luke começa a enfrentar uma série de desafios para provar seu valor. Todo herói mitológico cumpre este requisito, e podemos ver como Hércules realiza seus doze trabalhos, ou como o salvador gnóstico Neo, do filme Matrix, segue as instruções de Morpheus para se livrar dos Agentes, ou os Arcontes dos Aeons da mitologia gnóstica.

Luke enfrenta as tropas imperiais ainda no porto de Mos Eisley, quando embarca na lendária Milleniun Falcon com Han Solo e Chewbacca. Em seguida ele resgata a princesa, ajuda a destruir a Estrela da Morte, enfrenta o Império da batalha de Hoth, na qual é parcialmente derrota mas consegue se reerguer, e resgata Han Solo e seus amigos ao derrotar o poderoso Jabba.

Contudo, seu maior desafio ainda está por vir, e será revelado quando encontrar seu próprio pai. A luta entre pai e filho é um tema fundamental da Jornada do Herói, e pode ser encontrado em vários mitos gregos. O próprio Zeus só chegou a ser o pai dos deuses quando derrotou Cronos, seu pai, quem por sua vez havia chegado ao poder depois de derrotar Urano, seu pai.

A temática do conflito entre Luke e seu pai, Darth Vader, pode ser encontrado também na Bíblia, onde existe a noção de que os erros cometidos pelo pai são transmitidos para os filhos e as gerações seguintes. Há sempre uma marca deixada pelos antepassados e o herói não pode simplesmente escapar de seus efeitos.

Em uma batalha contada no quinto filme da série, o Ataque dos Clones, o pai de Luke é ferido por um golpe de sabre de luz do Conde Dooku. Seu braço é arrancado e uma prótese é colocada em seu lugar. Anakin, já convertido em Darth Vader, transmite sua cicatriz para seu filho, arrancando a mão de Luke quando os dois duelam na Cidade das Nuvens acima de Bespin, lar de Lando Calrissian.

A maldição é transmitida definitivamente logo após a mão ser arrancada pelo sabre de luz vermelha de Darth Vader, quando este conta à Luke que é seu pai. Neste momento Luke se dá conta que faz parte de uma família e pode decidir não perpetuar os erros de seu pai. Este é o ponto central em torno do qual giram os demais elementos mitológicos de Guerra nas Estrelas.

Todo drama mitológico narra uma grande batalha, na qual o herói recebe uma grande ferida. Esta será determinante ao longo de toda a sua jornada. Ela é a marca da maturidade do personagem central, que aprendeu sobre as dificuldades da vida adulta. Suas dores são grandes, mas maior ainda é a sabedoria que ela oferece ao herói, quem sempre se recordará dela nem que seja em sua própria carne.

Veja a Série Completa:


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