Origens Brasileiras do Dia dos Namorados
Absolutamente impiedosos são os dias curtos e os ventos gélidos do inverno, que enrijecem os corpos e sensibilizam a alma para o recolhimento e a reflexão. Neste estado obscuro que beira a melancolia, os corações solitários encontram inspiração para renovar suas esperanças de encontrar um amor que os complete e com quem possam compartilhar suas vidas.
No hemisfério sul, as baixas temperaturas vêm acompanhadas pelo Dia dos Namorados, que aqui no Brasil acontece no sia 12 de junho, ao contrário da maior parte do resto do mundo, que celebra a união amorosa dos casais no dia 14 de fevereiro. Este último é o dia da morte de São Valentim, o defensor do amor que no século III ficou conhecido como o patrono dos enamorados.
Ainda nos tempos de Roma, o Imperador Cláudio II havia decretado a proibição dos casamentos durante os períodos de guerras e combates, pois acreditava que os soldados solteiros eram melhores combatentes que os soldados casados.
O bispo Valentim, contrário à sobreposição de leis militares sobre o sacramento do matrimônio, seguiu realizando casamentos mesmo contra as ordens imperiais. Algumas lendas contam que ele próprio se casou neste período, e talvez tenha sido esta uma motivação pessoal muito poderosa para a sua romântica desobediência.
Encarcerado, recebia presentes, flores e bilhetes de muitos jovens que afirmavam ainda acreditarem no amor. Em sua triste e gélida cela, o bispo se apaixonou pela filha cega do carcereiro e, milagrosamente, restituiu a visão de sua amada. Decretado mártir pela Igreja, a data de sua morte se transformou em evento comemorativo do amor romântico.
Alguns já sugeriram que a data da celebração deste Dia dos Namorados tenha sido escolhida deliberadamente pelas autoridades cristãs, para que caísse exatamente no dia das Festas Lupercais, eventos bucólicos realizados para afastar os maus espíritos e purificar a terra, além de invocar as bênçãos de Pan, o deus da virilidade, da fertilidade e da florescência, e não o Pan vergonhoso, risonho e trapalhão, cujo caráter presunçoso é sustentado por certos ignorantes.
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Mas aqui, em terras brasileiras, a celebração do dia dos namorados acabou sendo instituída em ocasião diferente, pois seu mito fundamental não está composto pelas lendas de Valentim, mas sim de Antônio, o santo que nasce lisboeta e morre paduano, autor de inacreditáveis milagres e conhecido como o Santo Casamenteiro. Mesmo nascida em Portugal, a tradição se firmou no Brasil.
Há relatos que afirmam que, em suas pregações religiosas, Santo Antônio costumava destacar a importância do amor e do casamento acima de todas as outras coisas. Depois de ser canonizado, rapidamente a sua fama de Santo Casamenteiro teria se espalhado. Por tudo isso, a data da véspera de sua morte foi adotada no Brasil para celebrar o Dia dos Namorados.
Mas várias outras lendas corroboram este título. A principal delas tem origem na generosidade com que o frade, que presenteava as jovens sem dotes para que pudessem se casar. Santo Antônio vinha de família nobre e rica; seu pai, Martim de Bulhões, era descendente do celebrado Godofredo de Bulhões, comandante da I Cruzada, e sua mãe, Maria Teresa Taveira Azevedo, descendia do rei de Astúrias.
Há também a lenda que conta os eventos ocorridos na época em que Pádua foi governada por um tirano de nome Ezzelino. Este, através de decreto, obrigava as pessoas a levarem dote de igual valor ao casamento. Assim, rico casava com rico e pobre casava com pobre. Mandava o bolso e não havia mais espaço para o coração. Santo Antônio decidiu enfrentar Ezzelino em praça público, e tão forte foi sua defesa do amor que não só venceu o tirano, como foi carregado em triunfo e aclamado como Santo Casamenteiro.
E como não haveria de ser diferente, diversas outras lendas surgiram. Houve o caso da senhorita que, cansada de tanto de rezar e esperar que o Santo ouvisse as suas preces, atirou sua imagem pela janela da casa. Na queda, a estatueta feriu a cabeça de um rapaz muito rico que por ali passava. A família da moça o atendeu sem demora; os dois se conheceram e logo se casaram.
A partir deste momento o Santo Casamenteiro não teve mais descanso. Ainda nos dias de hoje é muito comum a realização de feitiços, disfarçadamente chamados de simpatias, rezas ou promessas, com o objetivo de arranjar um namorado. Num destes despachos católicos, uma estatueta do pobre Antônio é colocada de cabeça para baixo dentro d’água, sendo retirada apenas quando viesse o namorado.
Entretanto, os devotos sabem que Santo Antônio tem muitas outras serventias. Quando solicitado mediante o apropriado conjunto de sortilégios do folclore junino como orações, devoções, rezas, simpatias ou a poderosa Trezena de Santo Antônio, ajuda a encontrar coisas perdidas, a conseguir emprego, a curar doenças e a afastar perigos. São tantos os milagres concedidos por este grande santo português aos devotos sinceros que creem e rezam com fé, que um de seus epítetos é Santo Antônio para Todos os Fins.
Acostumado a realizar tão estranhos milagres, como estar em dois lugares ao mesmo tempo, fazer um jumento se ajoelhar diante de uma hóstia, persuadir os peixes a ouvirem suas palavras e manter as roupas secas em meio a um temporal, não deve ser difícil para Santo Antônio trazer a pessoa amada em menos tempo que qualquer cigana.