Reflexões Sobre Guerra e Paz
Estando na cidade do Rio de Janeiro para descansar durante alguns dias, rever amigos e assistir a celebração da virada de ano, tive a oportunidade de visitar o imponente Teatro Municipal, que abria suas portas para exibir a obra Guerra e Paz, de Cândido Portinari.
Os dois imensos painéis de quatorze metros de altura ficaram expostos por cinquenta e quatro anos na sede da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque, e impressionam não somente pelo contraste entre o desespero da guerra e o alívio da paz revelados em suas imagens, mas também por detalhes curiosos relacionados à visita de Portinari à inauguração da exibição.
Como era ligado ao Partido Comunista, o artista Portinari foi impedido pelo governo dos Estados Unidos a participar da primeira exibição daquela que é considerada a maior de suas obras, justamente na sede de uma instituição destinada a promover a paz. Uma contradição que somente os próprios conceitos de paz podem justificar.
De maneira geral, e tomando a liberdade de desconsiderar por um momento as complexas abstrações que podem ser tecidas a este respeito, a paz é geralmente definida como a ausência da guerra. Este era possivelmente o sentimento de Portinari quando compôs sua magna obra, uma vez que um dos painéis retrata a Guerra enquanto o outro retrata a Paz.
As grandes manifestações artísticas conduzem o ser humano a grandes reflexões, e a obra de Portinari nos convida a contemplar o problema da Paz desde um ângulo completamente diferente. Deixemos por alguns instantes os campos social e político para ingressar em nosso mundo psíquico particular, onde são travadas as mais violentas batalhas, e onde em nenhum outro lugar a paz possui valor mais inestimável.
A paz é um anseio natural de todo ser humano, assim como parece ser sua sina o desconhecimento dos motivos que o levam, inconscientemente, a abrigar guerras intermináveis nos campos do sentimento e pensamento. A mente e o coração se convertem nos mais devastadores campos de batalha, e a paz se torna nada mais que um sonho romântico.
Daí a necessidade de se cultivar a serenidade interior. O coração tranquilo e a mente serena permitem que a autêntica fonte objetiva de paz se expresse livremente, sem obstáculos subjetivos que trazem a ignorância e a dor, mãe e filha terríveis, que tornam a a existência um fardo se peso insuportável.
Esta autêntica fonte de paz é absolutamente espiritual. É o Ser Interior, fonte inesgotável de felicidade, que nos traz a paz, sempre que nos encontramos livres das disputas mentais e emocionais provocadas pelo Ego.
As transformações externas jamais poderiam nos trazer a paz. Provocar mudanças é um ato sem propósito, já que estamos sujeitos ao eterno mecanismo de mutabilidade que caracteriza a existência. O ideal é aprender como viver entre a mudança, de modo que, sejamos capazes de sanar nossa ignorância espiritual.
Junto ao Ser, esta ignorância desaparece, pois nos reencontramos com quem somos em realidade. Além disso, já não mais precisaremos do Ego que, com toda a sua pluralidade, se apega à transitoriedade material, trazendo dor e sofrimento. Neste instante, a Paz deixa de ser um sonho inatingível, convertendo-se numa experiência real e duradoura, presente nos mais delicados momentos de nossas vidas.